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quinta-feira, 12 de junho de 2008

Discurso de um Lobisomem pós-moderno

Hoje eu vi um fragmento andando numa calçada. Estava nu...
Era apenas um sorriso amarelo amanhecido como pão.
A correria pedalando nas máquinas do meu tempo
Comprando as horas mais preciosas que um dia foram gratuitas.
O homem apenas tentava, galanteador, conquistar o olhar da musa anônima.
A menina penteia seus cabelos olhando no reflexo da boneca com as mãozinhas cruzadas sobre as pernas tecendo uma poesia com um graveto no chão. E o menino tropeça seu sorriso em olhares estupefatos, como se o brincar fosse coisa de outro mundo.
Hoje, driblando a muralha de gente que encontro por aí,
Verifiquei que me sinto estranho.
E essa conduta de trafegar por caminhos desconhecidos me leva a comer carne crua
Naufragando meus sentimentos no mar.
O sal se mistura mesmo com o sabor do fel que cuspo por não conseguir digerir tijolos.
Parece que a peneira da vida peneirou meus instintos e um anjo voa por sobre a cidade e suas asas majestosas parecem ser o sinal do tempo, que, num esplendor celestial, assusta com a sombra que se forma numa abertura quase fantasmagórica. Parece que tem gente chorando e seguindo o seu rumo, disforme caminhar por onde a lágrima escorre, dando no abstrato do sentimento que já fora tão cultivado pelos sábios artesãos de palavras simples, que viviam uma vida simples, que emaranhavam o dia com os calos das mãos, bruscas como pedra, e o aperto mais confiável e verdadeiro numa troca de cumprimento. Compadres... Sim, eternos compadres e comadres... Marias... Josés... Seus dias à beira do terreiro contando causos para a pirralhada curiosa que pedia: - Conta aquela do Pedro Malasartes! Aquela em que ele enganou o rei enterrando rabos de porcos na lama!
Sim... Mas a mocinha moderna possui as pernas longas e finas e tem um nome estrangeiro e o rapaz presenteia-a com um celular de última geração.
É isso mesmo!!! Vamos celebrar a liberdade dos nossos dias pegando um ônibus rumo ao trabalho e contado as horas para chegar o fim de semana e tomar aquela cerveja. Talvez, a união suprema esteja naquela aliança dourada com uma inscrição interna com o nome da liberdade: Você e eu.
E quem ficar preso entre o dente e a carne rasgada possa mostrar sua face transparente colhendo um ramo de margaridas para enfeitar o vaso na janela da Julieta. Aqueles conflitos familiares são tão remotos. Hoje, são outros. Ninguém tem medo de sair no escuro, pois o saci fugiu de mim, lobisomem pós-moderno que sou. Transformo meus medos em utilidade pública e conquisto vítimas com um olhar encantador cantando uma canção sentado numa pedra à beira do destino do cidadão sem nome. E mastigo vagarosamente, quase que ruminando, todas as necessidades humanas como um rolo compressor passando sobre a fotografia da sociedade do meu tempo. Sim, gente. É enlouquecedor ter de possuir múltiplas faces só para satisfazer os caprichos gerais. Às vezes tenho de ser apenas cédula verde, noutras um sonho impossível. Há ainda momentos, pasmem, que tenho de tentar ser, num mimetismo quase perfeito, o amor. Há ainda quem tente essa alternativa, não sei se por falta do que fazer, se por desilusão com as maravilhas modernas. Quem sabe esses pequenos fragmentos no coração não venham reestruturar a ordem das coisas. Sinceramente, não creio. Pois de dia sou pessoa tranqüila procurando pelo que fazer e encontrando respostas pelo inexplicável. De noite sou fera desvairada correndo das coisas pelas quais não procurei e encontrando sossego na lágrima alheia.
Só sei que menina continua sentada com as perninhas cruzadas olhando as pessoas passarem e desenhando com um graveto alguma imagem inocente. E a poesia da vida segue seu rumo sem rimas, sem medo de morar num casulo e sair voando, mesmo que não haja mais jardins: as pedras não falam, mas contam história.

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