Eu vi, esticadas, miúdas sob a textura
irremediável, opaca, amarela, que
grunhe pelas pontas dos meus dedos,
que resfria meu espírito
pela gastura do tato – do jornal em prantos –
as letras em frase perene,
com a notícia
do fim do mundo.
A banca, o banco, a praça...
A primeira onde abarcam os perdidos
que se alimentam da descoberta
do segredo de não estar só.
O segundo, o anfitrião onde guarda o repouso
do vivo, que é morto,
onde recolhe da noite solitária,
o morto, que é vivo
e abre o espírito episcopal da humanidade
onde tudo se pertence, se distancia.
A terceira é a gênese do mundo,
onde a vida se extrai de uma lembrança e de um fim.
Onde as ruas se encontram e se despedem
e crianças guardam o choro
e embalsamam um grito de alegria
pela relva macia e descuidada.
Um cachorro não toma ciência do fim
quando seu latido escolhe
assustar o silêncio,
nem quando mudo, grunhindo amarguras
de abandono e frio.
Um cachorro é órfão de gente,
de existência e finitude.
Mas sente a morte que se aproxima,
não a sua, mas a do seu algoz,
ou senhor – ou coisa alguma – ou tudo.
O mundo já acabou quando a flor
pendeu a última pétala pela avenida,
caiu silente pelo asfalto
com sua branquidão de paz,
com sua vermelhidão de dor,
com sua escassa tonalidade de azul.
A flor cinza dos tempos.
Eu vi, pelos varais do mundo,
pequenos embrulhos esticados,
cartões postais dos países
que erradicaram as fronteiras,
eu vi estandartes de muitas pátrias
estendidos à unidade do povo.
Queríamos jardins,
caminhamos pelas pedras, em vão,
da liberdade.
Hoje, morre o mundo com seu rancor,
o mundo que extrai da vida
a porcelana de um sorriso, que é só dente,
mas que não sabe da fotografia
de um regato descendo a colina,
o mundo vestindo sua máscara de gente,
a roupa que segreda do corpo
o vento que é gratuito,
os pés que se escondem do chão
que um dia será abrigo e fim...
Hoje, o fim mesmo é só recurso
para vender jornal
e o fim morto e posto – onde degredo,
ao acordar cedo para a razão
e chegar tarde para repousar
meu verde brio
no travesseiro de um sonho.