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quarta-feira, 12 de junho de 2013

Poema de amor

Meu bem, quero-te antes, zen,
sem os truques e maquiagem
que te cobrem a pele.
quero-te incompleta,
sem o carmim de um batom,
para apreciar melhor teu beijo.
Sem o rímel que te ralça os cílios
para que a luz desvele teu olhar
e revele o fogo crispante da paixão
que se acende em mim.
Quero-te livre e solta
quando andas de chinelas trocadas
pela casa como se amanhã não existisse.
Quero-te assim
tão completamente linda
se reconhecendo em minha voz,
em meu tato, em minha vida.
Quero-te incompleta
mas repleta de mim,
pois eu já estou de ti
perdidamente íntegro
em amor e cumplicidade .

estribilho de uma nota só

...quando fores uma ponte, essa esticada diante do dia, diante da noite, quando fores uma ponte, desmontes então a canção que ainda não consegui ouvir e seja esse estribilho de uma nota só ressoando em meu coração...

terça-feira, 11 de junho de 2013

A infância do porvir

Sou um desacato
e mínguo a margem de mim.
Sou de um prato raso
sobras de um vazio,
pausa, silêncio e fim.
Sou de uma navalha
lâmina cega,
o barro crispado
nas mãos de um oleiro,
a taquara cruzada,
o vime envergado
que forma o cesto.
Sou graveto ao chão
testemunhando
as sombras da solidão,
o crepúsculo
num preâmbulo de amanhecer.
Sou prosa e rima,
desvalia morando
sina e abandono
calcando instante
num riso escondido no lábio
de alguma criança.

Entre pausa

Quede no grito
entre súplica e a temperança,
átimo de verdades
entre a fresta e o horizonte.

Quede inconstante:
risos, a púrpura do agora,
átomo de esvaziar medos.

Quede cedo
nos atalhos de seus fantasmas,
clínica de envaidecer coragem
e ruma plácido

para longe de seus escombros.

O tempo da tertúlia

Partes agora para essa parte que é minha,
essa morada irrestrita,
onde fica guardada a vontade de estar,
seja cerne, âmago, nesse preâmbalo de ser,
essa parte que finda sem razão para uma leitura,
mais ou menos ótica, de ser espaço aberto e vazio,
prestes a receber, sempre,
sem qualquer tolhimento,
a beleza das coisas simples.

domingo, 9 de junho de 2013

Contrução

O dono do boteco varrendo a rua deixando alta a ilusão de fabricar com poeira um panorama quase solitário da calçada. Os cães vigiam o passar e espantam a existência que sobrevoa teimosa fazendo órbita pela cabeça em sentido. O moleque empina a pipa olhando para o céu preenchido de brincadeira. O pai o beijou numa quase religião. O rosto com um bronze de sol. O olhar com uma prata de lua. E a complacência mútua da despedida. No balcão o copo americano preenchido de coragem. A garganta seca agradece: Deus lhe pague!

O embornal se sustentando no ombro vestido de camisa marrom. A marmita fria que vai saciar o vazio do estomago ao meio dia. A mulher que ficou para desembaralhar o tempo e deixar a sua hora de dormir mais tranquila. Pela manhã, um prato com cuscuz, uma xícara de café e seu amor guardado apertando o peito. Um olhar de afago. A rua comprida levando seus pés vestidos de sandálias. A calça curta se desculpando pela falta de pano.

Olhou para aquele céu vestido de edifícios. Seu ofício de fabricar o aconchego alheio. La embaixo o precipício. A corda roída sustentando o andaime calejado de seu corpo frágil. A janela sem cortina, seu vão de tristeza testemunhando a queda. O vento cortando a pele e amaciando o susto. Era sábado sem importância e o chão de grama verde recebendo seu grito pela tarde de outono. Era cinza o dia. A gente pasma. O murmúrio e, sem exigir nada, apenas as folhas caindo da árvore para fazer companhia numa cumplicidade de silêncio e fim.

quinta-feira, 6 de junho de 2013

lembranças de fevereiro

de repente, tudo é um caos.
a insurreição remota de um dia
longínquo pousa como um estandarte,
reverência sem palmas
ao palco calado dos olhos.
e aquela beleza fria
que causava algum rumor à pele,
que eriçava os pelos
mais tímidos do corpo,
talvez saltasse do calabouço
da memória e viesse à tona
como uma bela embarcação
que a mudez dos lábios,
que a falta de respostas
daquele telegrama alheio
e a paisagem sem janela
daquele olhar esmeralda de vidro
naufragou num verão qualquer
de fevereiro.

domingo, 2 de junho de 2013

Panis Angelicus

Há qualquer coisa deselegante
sem a importância do nexo

que anda pela rua...

O beco que esconde a malícia
no gingado da malandragem
do gueto.

Há qualquer enfeite de lantejoulas
ornamentando a véspera

de uma quaresma.

A alegria de uma gente
sem premissa de interesse
nem pauta para embasar o riso.

Há qualquer coisa triste
que embeleza mais que

o melindre de uma culpa.

O sujeito de mãos sujas
que limpa sua honra levando
o pão pelo mérito do trabalho.

Há qualquer salário
financiando o direito de muita gente

a viver muito com pouco.

O desgosto salgado com suor
e o brinquedo fabricado
em folhas velhas de jornal.

Há qualquer criança
nos fazendo lembrar

que o futuro ainda não chegou...


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