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quarta-feira, 28 de maio de 2008

O que vale voar?

O que vale?

Sair de mim para ser feliz
Encontrar no berço do acaso
Um resvalo no encanto de um triz
E navegar em meu caminho raso

O que vale viver?

As escadas, as pedras, as alavancas
Pujanças do bem ou do mal
Que jazem em meu corpo em pelancas
Tolhendo meu lado natural

O que vale viver nessa vida?

Uma mentira que não acaba:
as escolhas não são como folhas:
caem no chão, secas, fenecendo a cor tão esperança
cobrindo os olhos da criança de pura imaginação.

O que vale viver sem razão?

As andorinhas nos visitam em cada verão
E os pardais continuam gorjeando eternamente em nossos telhados
Sem ter fuga da estação, sem ter medo da prisão,
Sem aquecer o coração com novas histórias,
Sem perguntar: por que nós também não voamos?

O que vale voar, então?

Vale escolher os rumos e os ventos,
Escolher ter morada ou não precisar dela.
Vale realmente ser dono da verdade mais inerente de ser
Com os caprichos ou desapegos
Sem precisar de torres e castelos
Para fazer o nosso ninho.

domingo, 11 de maio de 2008

Introspecção.

Somente nos cantos da demora vigora o auge da paciência.
Andando, preciso ver o quanto deixo para trás,
Olhando a poeira que guarda alguns segredos que essa vida já não revela.
Num verso branco, escondida em rimas disfarçadas,
A poesia toma um tom, uma forma ancestral,
Mas que jorra n`alma daquele que a sente, que é.
Jaz nas mãos do operário, que sabe construir,
Nas mãos do compositor, que sabe compor.
Desenhar e cantar podem ser aprimorados,
Mas já está embutido como o couro que veste o corpo.
Trabalhar é buscar um sacrifício todos os dias
Esperando colher no precipício algum rascunho
Que será, talvez, alguma poesia.
Nessa hora, quando os pardais te acordarem,
Nenhuma chuva molhará a sede da verdade.

domingo, 4 de maio de 2008

Ira cinzenta

Quem são eles que chegaram brancos,
Que, aqui e acolá, caminham mancos
Alguns nos bancos, outros nos flancos da imaginação
De uma nação de ninguém?

Quem são eles, vestes luminosas resplandecentes no cetim,
O vime como cetro que rege num trono de marfim,
Caçando um fim, dançando a hora, mastigando o tempo num lapso de existir?

Quem são eles, fios e farrapos como pratos na mão,
Como vermes que cuspiram a sujeira nas faces mais cândidas
E rodopiaram os vestidos das mocinhas que se recusam a digerir a abundância
E ainda estão no limite, ninguém tolera?

Quem são os “malditos”, quem são os Beneditos
Nos olhares de ébano que lustraram nossa carne
Que rosada virou parda, que parda virou o tom,
Que ditou o som da nossa dança mais moleca?

Quem são os tambores que estão na cor, ação
Conjunta que move a máquina do mundo,
Que agora é apenas um sonho de liberdade
Pois a herança ainda se faz presente
E o capitão não precisa de mais mato?

Quem é essa gente que não sabe que a carne mais podre
É ainda mais pura do que aquela que já apodreceu a alma
Por não saber que o melhor trono é a inconsciência mais plena
Regida pelas sombras majestosas da eternidade
E que faz a tudo a e todos apenas meros nadas?

Quem é? Quem são? Quem se importa
Com uma porta que está sempre fechada,
Com uma casa sempre vista pela fachada,
Com uma veste que é apenas anágua
E a água mais limpa é sempre vertida pelo suor?

Quem são? Ioruba, caboclo,
Curumim com a palma da mão aberta,
Um sorriso rosado por trás dos vidros escuros,
Um olhar assustado, um limite imposto pela ignorância
Dos mais sábios, pela sabedoria dos mais simples?

Quem aceitou toda essa merda?
Quem foi que disse que é preciso haver campos delimitados,
Que é preciso mentir para conquistar a verdade,
Que é preciso matar para conquistar a liberdade,
Que é preciso vencer para conquistar a vitória?

A vitória... a vitória minha gente, a vitória?
De quem é a vitória, de quem é a glória de andarmos na lama?
De quem é esta cama de gato feita por nós mesmos?
É tudo cinza, ninguém ver, mas é tudo cinza.

quinta-feira, 1 de maio de 2008

Eu quis

Eu quis o perigo
Quis fazer um abrigo numa procura
Que cala minha loucura desenfreada

Eu quis botar os pés na estrada
Saindo de mãos dadas com a madrugada
Com uma mochila, um tênis e dois reais

Eu quis surtar de vez em quando
Quis subir a âncora e aportar em outros caís
Fazer uma omelete em minha varanda

Entrar numa quitanda
Saborear o ar num arvoredo
Ler um verso do Quintana e sentar a bunda num rochedo

Eu quis descobrir o meu segredo,
Fazer remendo em meu medo
E espantar um desespero.

Eu quis o exaspero
Quando roubaram a minha calma
Eu quis a minha alma na palma da minha mão

Eu quis deitar no chão
E observar a dança das estrelas
Eu quis a fé vermelha, são elas, são elas

Eu quis ver um brilho num sorriso
Uma alegria num olhar
Eu quis ser mais preciso

Eu quis a terra, o mar, o ar
Eu quis calar quando o silêncio
Apenas queria gritar,

Quando o momento
Era apenas fuga
Misturada em sentimento

Eu quis permanecer
Para sempre parado
Num instante de amar

Eu quis o mar,
Amar o mundo
Amar o tudo que há em você

Eu quis o prazer
Misturado com uma dor de perda
Com uma saudade que me deixa tão longe de mim

Eu quis o fim
Quis acabar desmanchado no estalo de um beijo demorado
Eu apenas quis ficar calado

Sem demora
Com o que vale a pena
Com o instante que faz acontecer.

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